1. |
Eu como
02:22
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Eu como a língua
com faca e garfo
- espeto o garfo no sujeito ah!
e corto o verbo aos bocados rererererererererererrrre
Eu como a língua
à colherada
- sopa de letras pequenas
no prato não fica nada
Eu como a língua
com os dedos
- arranco a chicha vogal a e i o u
aos ossos mais consoantes sssxxxzzzz
Eu como a língua
à dentada
- mordo a cauda do zunzum
cuspo conversa fiada
Eu como a língua
com sal e pimenta atchim
- as frases sabem-me a pouco
e a boca quase rebenta atchiiiiim
Eu como a língua
pela calada
- com vírgulas de andorinha
voam por tudo e por nada
Eu deito a língua de fora
e falo de boca cheia
sinto pernas
eu sinto pernas na garganta
crescem-me asas na veia
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2. |
Consultório
05:10
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_ a e i o u, u o i e a, a e i o u, u o i e a, cavidade, cavidade, a e i o u, u o i e a, a e i o u, u o i e a, lábios, lábios, a e i o u, u o i e a, a e i o u, u o i e a
_ i o u, i o u, iou, iou, i a , ia, ia, iouia, iouia, iouiá, iouiá, iouiáiáiáiáiáiá
_ ne, ne, ne, ne (esfregar as fossas nasais), nhe, nhe, nhe, nhe, lhe, lhe, lhe, lhe (repetir até o público estar instalado)
_ um le, um le, um le, um le, le, le, le
_ lhe, lhe, lhe, lha, lhe, lhi, lho, lhu, lha, lhe, lhi, lho, lhu, lhac, lhac, c, c
_c, c, c, cá, cá, cá, quá, quá, quá, gutoral, ga, ga, ga
_ um le e um gá, um le e um gá, glá, Ah!, glá, gla, gle, gli, glo, glu, gla, gle, gli, glo, glu, gla, gle, glícidos, glo, glúteos, glutemn, n, n
_ ne, ne, ne, ne, me, me, me, meu, eu?, ah?; me, me, me, meu, eu?, ah?
_ ah!, o h (pausa) fica calado
_ um le, um le, um le, um le, le, le, le, la, le, li, lo, lu, la, le, li, lo, lu, la, le, li, lo, lu, lula, lula
_ i, ga, i, ga, i, lín, i, lín, i, ga, i, ga, i, língua
_ um pe, e um be, um pe, e um be, be, be, be, be, bábebibobu, babébibobu, babebíbobu, babebibóbu, babebibobú, solta, solta, ar, ar, bre, bre, bre (lábios-cavalo do grave ao agudo), be, be, be, be, be, bábebibobu, babébibobu, babebíbobu, babebibóbu, babebibobú, babam-se os bes, babam-se os bes
_ e um pe, pe, pe, pe ,pe, pepepá, pepepé, pepepí, pepepó, pepepú, pepepá, pepepé, pepepí, pepepó, pepepú, pú, pú, é boato!
_ pepepá, pepepé, pepepí, pepepó, pepepú, pepepá, pepepé, pepepínto, pinto, pinttttt
_ ttttt, kx, p, ttt, kx, p, ttt, kx, p, ttt, kx, kx, está bom Jorge?, p, ttt, kx, erra, p, ttt, kr
_ o pinto pia kx, o pinto pia kx, quanto mais o pinto pia mais a pia kx, o pinto pia kx, o pinto pia kx, quanto mais o pinto pia mais a pia pinga
_ pinga, gutoral, pinga, pinga a pia, apara o prato, pia o pinto e mia o gato, pinga a pia, apara o prato, pia o pinto e mia o gâteau, gâteau?, gâteau?, gato?, n’est pas gâteau, est le gato
_ gato, tu, tu, tu, ta, te, ti, to, tu, ta, te , ti, to, tu, ta , texto, texto
_ i, ga, i, ga, i, lín, i, lín, i, ga, i, ga, i, língua
Digam se eu sou língua morta,
se já nenhum pensamento
vem bater à minha porta.
Ou se estou viva da silva,
banhada em sal de saliva
tão viva, que toda gente
de pequenina me aprende
e se prende ao meu cantar,
Até mãe, vejam lá só,
o povo me quer chamar…
Percebeste ou fingiste que percebeste para que os outros percebessem que tinhas percelambido?
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3. |
Rosa dos Ventos
02:04
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2
Já reparaste que a língua
também tem rosa dos ventos
que para uma certa coisa
a norte se diz assim
quando a sul se diz assado?
Os miúdos são gaiatos
a sertã é frigideira
o estrugido refogado
o aloquete [aloquê?!] cadeado
a tampa testo se torna
e a água do bueiro
só na sarjeta se entorna.
Se chove a gente do norte
saca de seu guarda-chuva
enquanto no sul se pinga
é antes chapéu de chuva
quando não mesmo sombrinha
o nome dessa invenção
que nos vem da grande China.
Lancha-se não se merenda
bebem-se finos ou pingos
pois soa meridional
que o puto peça um garoto
e o pai [sai] uma imperial [!].
E logo pela matina
salta a roupa da cruzeta
e não tanto do cabide
espremem-se espinhas ao espelho
e não borbulhas, canté!!!
Calca-se o chão com o pé
enquanto a sul do Mondego
se pisa a calçada preta
E se à minha beira ouço
falar bera e curto grosso
sei que ao pé de mim não está
uma boca lisboeta…
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4. |
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«Um prato de papa dentro do papo do papa.»
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5. |
Caiu-me
03:33
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caiu-me a lua no prato
caiu-me a luva no palco
caiu-me a luta no peito
caiu-me chuva é boato
o papa come abrenúncios
o polícia papa moscas
o poeta [dá-lhe Jorge!] engole sapos
o padeiro lambe roscas
sobem-me cus à cabeça
crescem-me pêlos na venta
falta-me calo na língua
sobra-me massa cinzenta
caiu segredo no poço
caiu cabelo na sopa
caiu a pata na poça
caiu-nos mal o almoço
o papá anda às aranhas
o puto apanha bonés
o profeta diz patranhas
o padre leva c'os pés
sobem-me cus à cabeça
crescem-me pêlos na venta
falta-me calo na língua
sobra-me massa cinzenta
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6. |
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Suor-pingo suor-poça suor pingo-poça
Suor-pingo suor-poça suor pingo-poça
A menina vírgula vivia numa frase desértica
A sua miragem era um ponto.
Um ponto de água: fonte, poço, poça, charco, lago. Mar
Suor-pingo suor-poça suor mar suor pingo-poça-mar
Para lá caminhava aos tropeções, como caminham as vírgulas.
Suando as estopinhas, como é costume suarem criaditas, serviçais e escravas.
Só do seu suor podiam brotar a miragem que lhe mataria a sede.
E isso fazia-lhe sentido.
Isto é: fazia-a sentir-se útil.
A menina vírgula estava muito perto da sua miragem.
Isto é: de refazer o texto à sua imagem.
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7. |
Palavras grávidas
00:46
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Certas palavras estão grávidas
de outras tantas palavras.
Há um nu oh! a subtrair
do número sorteado
e um tu bem camuflado
na testa do tubarão
um ele muito elegante
no ventre o elefante.
Há um eu [tu ele nós vós eles] na euforia
de falar dia após dia
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8. |
Senhora dona
05:38
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Era uma senhora dona
que vendia palavrinha
palavrão e palavrona
uma ao preço da chuva
outras da uva mijona
Vai a menina catraia
abeira-se do balcão
e puxa-lhe pela saia
para lhe soltar a língua:
«Ó minha senhora dona
que palavras preciosas
tem na sua loja à venda
com que eu me possa enfeitar?
- Eu tenho palavras caras
vindas do grego por mar
dizem os sábios sabidos
que ajudam a pensar.
- E quais as que me aconselha
das que fazem matutar?
pergunta afoita a fedelha
à dona de seu falar?
- Se fosse a si, eu levava
100 gramas de ortografia
alguns astros a granel
biblioteca uma fatia.
- Belas e doutas palavras…
Mas não me fazem sonhar.
Não tem artigos mais leves
que me possam ilustrar?
- Tenho almocreve, azeitona,
algarismo e alguidar.
Mil noites atravessaram
mais uma sempre a contar.
Vêm do tempo dos mouros
que esta terra governaram
com grande sagacidade
pois que sempre a respeitaram.
- Não é o que vem nos livros,
logo comenta a cliente.
- Por vezes os livros mentem
a mando de quem só mente.
- Será que na sua loja
ricamente fornecida
tem palavras mais… modernas
que possam servir na vida?
- Mas prefere galicismos
com saborzinho a francês?
Anglicismos com fartura?
Italianismos… talvez…?
Na franca categoria,
tenho champanhe e ballet,
gafe, toilette, bufete,
chauffeur, chalet e crochet…
Retretes e bibelots
bâton, puré, camionetes
boutiques, guichets, vitrines,
soutiens chiques e raquettes.
Nas mais anglas prateleiras
há cowboys e drag queens
hits, sites, pubs, bifes,
remixes, remakes e afins.
E no sector do esparguete,
para além do macarrão,
há um piloto, um maestro
e até mesmo um charlatão…
Paletas, feltros, pomadas,
fossos, esboços, cenários,
bagatelas e cantatas
talheres extraordinários.
- É tanta a variedade
que não consigo escolher!
- A língua, minha menina,
dá para dar e vender…
Língua é pano para mangas:
quem come chora por mais!
Por palavras diferimos
de outras vozes animais.
E pelo gosto da fala
é que a gente se faz gente,
amando perdidamente
tudo quanto não nos cala.»
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9. |
Cansom
04:46
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Trovejam tês
Os efes fogem
Vibram os vês
Os esses somem
Os jotas jubilam sós
Jogam com ás e com és
Mas roubam pontos aos is
E só se ajeitam com ós
Mentem os emes
Gaguejam os guês
Riem os erres
Babam-se os bês
Os jotas jubilam sós
Jogam com ás e com és
Mas roubam pontos aos is
E só se ajeitam com ós
O ene já nasce nu
E o ele lambe a luz
Então o kê cai de cu
E zune o zê ai jesus
Os jotas jubilam sós
Jogam com ás e com és
Mas roubam pontos aos is
E só se ajeitam com ós
Pisam-se os pês
Doem os dês
O x sente-se riscado
E o h fica calado
Os jotas jubilam sós
Jogam com ás e com és
Mas roubam pontos aos is
E só se ajeitam com ós
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Teatro do Frio Porto, Portugal
O Teatro do Frio - Pesquisa Teatral do Norte (TdFrio), é um colectivo de criação e pesquisa teatral constituído em 2005. Privilegia o devising enquanto método para criação artística e escrita cénica de novas dramaturgias, numa lógica colaborativa que instiga os criadores ao diálogo interdisciplinar e assume o corpo do actor como espaço criativo e veículo de conhecimento. ... more
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